sexta-feira, 6 de março de 2015

Do primeiro ano.

Oi, vó.

Estou escrevendo para te contar que hoje a saudade não está maior que nos outros 365 dias que se passaram desde a sua partida. Eu não me sinto menos amada ou mais sozinha, a sua ausência hoje tem o mesmo peso dolorido de sempre, que me faz lembrar todos os dias que eu não posso mais estar com você nesse plano.
Eu não sei se aí desse lado você tem internet, não sei se vai ler as minhas palavras, mas tenho certeza de que o sentimento que coloco nelas enquanto escrevo flui até você, assim como eu posso sentir a sua vibração de amor quando preciso da sua ajuda.

Vó, eu não quero ficar triste. Esse afastamento temporário não precisa ser despedida e, se for despedida, não tem porque ser dolorosa.
Substituo por gratidão. Obrigada por ter escolhido estar comigo nos primeiros vinte (quase vinte e um) anos da minha vida, obrigada por ter me agraciado com sua presença, seus sorrisos, rezas e preocupações. Obrigada por ter, no plano espiritual, acolhido a missão de, junto dos meus pais, me ajudar a formar caráter e construir uma fé inabalável.

Eu sei que você não era perfeita, vó, mas meu olhar pra você ainda é o mesmo daquela menina de 5 anos em quem você vestia o vestido rodado de laço e levava pra igreja. Que você saiba que hoje, ao vestir o branco e ir para o terreiro, o faço com a mesma alegria e entrega que você me ensinou. Eu sei que a fé, ainda que diferente, nos conecta.

Vó, eu não quero ficar triste, porque a tristeza da sua partida não se sobrepõe à felicidade de sua existência, à certeza da sua luz.

Vó, eu não vou ficar triste, porque não foi isso que você me ensinou.

Você dormiu aqui pra descansar dessa vida dura, mulher guerreira, e acordou em outro lugar.
E eu aprendi a te encontrar na luta, na esperança, em Jesus e em Oxum, no meu anjo guardião.
Eu não vou ficar triste porque o que aconteceu há um ano foi renascimento - a gente morre para se tornar o que é.

Então, feliz aniversário, vó. Pra nós duas.

(Taboão da Serra, 23 de fevereiro de 2015)