sábado, 18 de abril de 2015

"Meu amor, deixa eu chorar até cansar".

É que eu sou só isso: 22 anos, 160 cm, alguns livros de doutrina espírita e umbandista, velas e exata meia dúzia de saias coloridas. 51% fé, 49% desespero.

Tô aqui sentada querendo fazer besteira, mas tem esses 2% mantendo meus pés no chão.
Tem esses 2% sussurrando que isso, seja lá o que for, também passa.
Tem essas lágrimas que molham as velas que eu acendo enquanto peço socorro.
Tem essa solidão que, que engraçado!, virou minha melhor companhia.

Olha, amor, eu se tivesse opção talvez não quisesse ser assim, Mas depois de alguns anos você aprende a lidar com você mesma, até a gostar.
Amor, a minha bagagem é pouca, mas minha sede é muita e isso me basta.

Existe uma diferença grande entre ser e sentir-se. Eu não ando me sentindo bem comigo mesma, mas sei o que eu sou e não é feio, não é pouco, não é ruim. É a medida exata do que eu preciso ser e do que dou conta de lidar.

Acho lindo mudar, sim. Acho que enriquece, que ilumina e faz crescer... Mas é lindo quando acontece na hora que tem que acontecer. E eu não quero mais ultrapassar os meus limites.
Eu ando ultrapassando os meus limites e não tô conseguindo lidar com a dor das consequências.
Talvez agora tenha chegado a hora de dar aquele passo pra trás. Um caboclo me disse que é andando pra trás que a gente pega impulso pra seguir caminhando.

Estou aqui parada, sozinha, encarando os meus limites enquanto a voz do Vander Lee ressoa lindamente pelo apartamento.
Amor, é isso que eu sou e é isso que eu me permito ser.

Eu sei que um dia vou lutar pela revolução ao seu lado e você vai poder me chamar de camarada, eu sei que um dia eu serei tão grande quanto você cobra que eu seja.
Mas agora eu sou só o que os meus 22 anos me permitem, com todas as falhas e medos e confusões que uma menina (não digo nem mulher!) de 22 anos pode ter.

Hoje você disse que não se contenta com pouco, se referindo a mim. Por favor, não se contente. Você é grande e merece tudo o que tem e deseja ter.
Mas, olha, respeita a minha pequenez. Respeita esse meu medo bobo do escuro. Respeita essa minha mania de olhar pros olhos das pessoas tentando enxergar Deus lá dentro. Respeita essa minha fé que é tão visceral, porque são esses 2% que me separam da loucura.

Não se contente com pouco, amor.
Sabe esse mundo? É grande, é lindo e é seu.
É grande, é lindo e é meu também.
Aqui vai um apelo:
Esse mundo poderia ser nosso, mas não se obriga. Não faz casa aqui se não é aqui que você se completa.
E, por favor, não seja cruel. O mundo é lindo, mas tem muito disso nele (ainda que eu continue achando que o saldo final é positivo).

Sigo te amando.

Com todo o desapego do mundo,
                                Laranjeira.

(Taboão da Serra)

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Da antiga.

Hoje eu acordei um pouco dona Carlota.
Carlota, a ciganinha desgarrada de quem me falava a minha avó.
Há tantos anos.
Avó do avô do avô da minha avó. É tempo que eu não sei contar!

Características de dona Carlota, que eu encontro nas mulheres fortes do sangue que ela passou.
Esse andar insidioso, esse riso faceiro.
Esse não precisar ler mãos, porque do futuro a gente sabe. A gente sabe que a Deus pertence, mas que Ele nos dá dicas, ah, Ele dá.
Essa herança de pouca valia que nos faz. Esse olhar por baixo dos cílios, a altivez do queixo, a sorte no jogo da vida.
Essa vida que nos é próspera simplesmente porque não falta amor.

Colorido nas roupas, colorido nos lábios.
Vejo ciganices de séculos atrás florindo na vida seca da nossa selva de concreto.
Sou um pouco Calon, sou um pouco Roma.

Salve Santa Sara, hoje mais que nunca rogo sua proteção!

(São Paulo, 07 de março de 2015)